ENFOQUE MACRO | INFORME SEMANAL E PERSPECTIVAS
BRASIL: Produção industrial avança 0,7% em fevereiro, acima das expectativas
MUNDO: EUA registram número expressivo de abertura de vagas em fevereiro
Cenário econômico e perspectivas
Após o choque nos preços de commodities observado no final de fevereiro por conta do conflito na Ucrânia, houve certa estabilização nas últimas semanas. O petróleo permanece especialmente volátil, mas mantemos o cenário base de patamar próximo de USD 120 no final do ano (a liberação de reservas estratégicas nos EUA contribuiu para aliviar as cotações no curto prazo). O principal risco olhando adiante está nos grãos, particularmente na possibilidade de agravamento da perda de produção de milho. Assim, temos uma mudança de patamar do preço de commodities que encontrou certo equilíbrio temporariamente, mas que implica em pressão adicional sobre um quadro já desfavorável de inflação global. Nesse momento, um novo risco se apresenta: a onda mais intensa ao longo de toda a pandemia na China. Avaliamos que os lockdowns seguirão atingindo diferentes cidades por um longo período. O impacto sobre as cadeias globais de produção é bastante incerto, mas evidentemente negativo. Nesse ambiente, mantemos a perspectiva que o aperto de juros em países desenvolvidos ainda está apenas no início. As indicações do Fed reforçaram a possibilidade de aceleração do ajuste de sua política monetária. Nossa expectativa é de altas de 50 pb nas próximas três reuniões e anúncio de início de redução do balanço. Esse movimento aponta para uma taxa terminal do ciclo de ajuste acima de 3%. O balanço de riscos desfavorável segue colocando viés de alta para essas projeções.
Em sentido oposto ao Fed, podemos interpretar as últimas mensagens do Banco Central do Brasil como o anúncio do final do ciclo de elevação da taxa Selic em 12,75% (que seria concluído em maio com mais uma alta de 100 pb). Parece ser necessária uma mudança substancial dos preços de commodities ou das expectativas de inflação para levar o Copom a reabrir o ciclo de ajuste da taxa de juros. Há chances razoavelmente favoráveis para que se tenha sucesso com essa estratégia: o nível da taxa real de juros do final do ciclo é significativamente contracionista (ao redor de 6,5% quando consideramos a expectativa de inflação para os próximos 12 meses); o “canal da taxa de câmbio” voltou a funcionar nesse ano, com apreciação de cerca de 18% (de forma surpreendente, tendo em vista a grande abertura de juros nos EUA). Quando comparado ao ciclo anterior de aperto da política monetária (quando a Selic atingiu 14,25% em 2015), o principal fator desfavorável do caso atual é o comportamento da inflação global, muito mais elevada e com características persistentes. Vale lembrar, o ambiente global até o final de 2019 era caracterizado por taxas de inflação abaixo das metas nos principais países. Em conjunto com uma inflação corrente também bastante elevada (em torno de 10%, semelhante ao nível observado naquele ciclo anterior), as pressões inflacionárias globais se apresentam como o principal risco para que a taxa de 12,75% possa se mostrar insuficiente para devolver a inflação de volta à trajetória das metas.
Eventos da semana
No âmbito internacional, o destaque dessa semana ficou para a divulgação dos dados de mercado de trabalho nos Estados Unidos, dos indicadores de inflação na Europa e da continuidade do aumento de casos de Covid-19 na China. Em relação a esse último fator, o governo chinês tem efetuado bloqueios e restrições à mobilidade em Xangai e em outras províncias do país. Sendo assim, com a possibilidade de prolongação de medidas restritivas, somado à continuação do conflito entre Rússia e Ucrânia, as pressões sobre as cadeias de produção globais tendem a persistir. Na próxima semana, os principais mercados aguardam a divulgação da ata de política monetária do Fed. No mercado local, o destaque continuou sendo os ingressos relevantes de fluxo de portfólio e a divulgação dos dados do mercado de trabalho. A taxa de desemprego registrada no mês de fevereiro ficou em 11,3% (com ajuste sazonal), resultado que pode ser atribuído à estabilidade da força de trabalho em meio à alta de 0,3% da população ocupada. Em relação ao comportamento dos ativos locais no primeiro trimestre, o destaque ficou para o resultado do Ibovespa com valorização de 6,1% em março e 14,5% no ano. Na parte de renda fixa, o índice IMA-B teve significativa recuperação no ano, fechando o mês de março em 3,1% e acumulando variação de 2,9% em 2022.
A produção industrial avançou 0,7% na margem em fevereiro. O resultado veio acima da nossa expectativa (0,3%) e da mediana do mercado (0,5%). A alta pode ser atribuída em maior parte à indústria extrativa (5,3% M/M), que se recuperou após a queda de 5,1% em janeiro causada pela interrupção de produção de minério de ferro em Minas Gerais em virtude das fortes chuvas. Com isso, a indústria extrativa se situa 0,3% abaixo patamar pré-crise. Já a indústria de transformação apresentou avanço de 0,6%, ante queda de 3,0% em janeiro, passando a se situar 1,6% abaixo do nível pré-crise. Dentre as atividades, as maiores contribuições positivas vieram da fabricação de produtos alimentícios (2,4%), puxada por carnes e açúcar, fabricação de veículos (3,2%,) e fabricação de produtos farmacêuticos (12,7%). Vale lembrar que, como em janeiro várias montadoras de veículos tiveram férias coletivas, o resultado positivo do setor representa uma correção parcial. A maior contribuição negativa foi proveniente do refino de petróleo (-1,8%). A média de janeiro e fevereiro da indústria geral representa queda de 0,1% em relação ao quarto trimestre de 2021, com -0,4% para a indústria extrativa e alta de 0,2% da indústria de transformação. De modo geral, o resultado positivo da indústria em fevereiro reflete um maior índice de difusão (63% das atividades tiveram crescimento), embora a regularização da produção extrativa e de veículos tenham sido importantes para a recuperação do resultado de janeiro. Considerando o núcleo que exclui adicionalmente setores afetados pelo processo de rebalanceamento da demanda, haveria alta de 0,3% da produção da indústria de transformação, sugerindo que o deslocamento de demanda tem exercido papel pouco significativo no mês. Nessa leitura, os problemas de oferta não foram relevantes para o resultado, mas frisamos que, ao longo dos próximos meses, problemas nas cadeias de fornecimento de insumos poderão persistir e se intensificar em virtude do conflito Rússia-Ucrânia e da nova onda da pandemia na China.
A taxa de desemprego atingiu 11,2% no trimestre encerrado em fevereiro. O resultado veio abaixo das expectativas de mercado (11,4%) e da nossa projeção (11,3%). Na série com ajuste sazonal, a taxa passou de 11,5% em janeiro para 11,3% em fevereiro. A menor taxa de desemprego na margem pode ser atribuída à estabilidade da força de trabalho em meio à alta de 0,3% da população ocupada. Com isso, a taxa de participação com ajuste sazonal recuou de 61,8% para 61,7%. Houve elevação na margem tanto de trabalhadores formais (0,3%), com maior influência de empregados no setor privado com carteira assinada, como de informais (0,3%), com maior contribuição de trabalhadores familiares auxiliares. Dentre os setores, as maiores contribuições positivas para o crescimento de ocupados foram de administração pública, educação e saúde (1,2%) e de construção civil (1,5%). De outro lado, as principais contribuições negativas vieram de serviços prestados às empresas (-0,3%) e de transporte, armazenagem e correio (-0,4%). Estimando o que teria sido o comportamento mensal da PNAD, concluímos que a perda de massa de renda desde o início da pandemia (cerca de R$ 468 bilhões) até dezembro do último ano foi compensada pelo montante de auxílio emergencial e benefício emergencial no período.
Em linha com as surpresas positivas no mercado de trabalho, o Caged registrou a criação líquida de 328,3 mil vagas em fevereiro. Com ajuste sazonal, o saldo foi positivo em 287 mil postos de trabalho, ante média de 223 mil vagas nos três meses anteriores. Por trás da aceleração do saldo na margem está a elevação das admissões (7,6% na margem) em ritmo superior ao das demissões (1,3%). Vale mencionar que atualmente o patamar de admissões já supera em 36% o nível pré-crise. Na abertura por setor de atividade, todos os setores tiveram resultado positivo, com destaque para serviços (100 mil, ante 88 mil em janeiro), comércio (41 mil, ante 20 mil) e construção (41 mil, ante 18 mil). Tanto os dados da PNAD quanto os do Caged evidenciam a força do mercado de trabalho formal em meio ao fim do processo de reabertura da economia, com ressalvas para a perda da massa de renda real, que segue 6% abaixo do nível pré-crise e indica a queda de qualidade das ocupações e reajustes salariais aquém da inflação nesse período.
O governo central foi deficitário em R$ 20,6 bilhões em fevereiro, ante déficit de R$ 21,3 bilhões no mesmo período em 2021. Comparado com fevereiro do ano passado, a melhora foi liderada pelo aumento real de 14,8% das receitas, com destaque para o avanço na arrecadação com imposto de renda e a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), além das receitas com concessões, dividendos e exploração de recursos naturais que adicionaram cerca de 15 bilhões ao resultado. No lado das despesas, o avanço real foi de 6,5%, liderado pelo pagamento de abono, crédito extraordinário, subsídios e auxílio. Vale notar que em 12 meses, as despesas (excluindo gastos de combate ao covid-19) seguem em trajetória estável. O resultado não altera o cenário para o ano de déficit de R$ 94 bilhões do governo central, significativamente abaixo da meta de R$ 170 bilhões.
Os EUA registraram criação de 431 mil vagas de emprego em março. Embora o resultado tenha ficado abaixo da expectativa de criação de 490 mil vagas, a série contou com revisão positiva de 72 mil vagas em fevereiro. A taxa de desemprego recuou de 3,8% para 3,6%, abaixo da expectativa 3,7%, mesmo com o avanço da taxa de participação de 62,3% para 62,4%. A respeito dos salários, houve alta de 0,4% na margem, com alta de 5,6% em termos anuais. Destaque positivo para o setor de lazer, que acumula alta de 11,8% em termos anuais. Em relação ao patamar pré-crise, o número de empregados se situa 2,2% acima, ao passo que o número de pessoas à procura de emprego alcançou o patamar de janeiro 2020 apenas nesse mês. Em resumo, o relatório de emprego de março segue compatível com a avalição do Fed de um mercado de trabalho “muito forte” e continuidade do aperto monetário.
Na Zona do Euro, a inflação ao consumidor (CPI) apresentou novamente variação acima da expectativa na prévia de março. Em termos anuais, o CPI variou 7,5% ante expectativa de 6,7% do mercado, significativamente acima da variação de 5,9% registrada no mês anterior. O destaque mais uma vez ficou para os preços de energia, que tiveram variação anual de 44,7% em março, ante aumento de 32% registrado em fevereiro. O núcleo da inflação, métrica que exclui a inflação com alimentos e combustíveis e costuma receber mais atenção por parte das autoridades monetárias, avançou para 3,0% na comparação anual, abaixo da expectativa do mercado de 3,1%, mas acima da leitura de fevereiro (2,7%). De forma geral, a pressão sobre a cadeia de bens e a alta nos preços de energia tendem a manter a inflação em trajetória altista, corroborando o cenário de redução do estímulo monetário pelo Banco Central Europeu nos próximos meses.
Por fim, os dados de confiança (PMI oficial) na China mostraram um nível de atividade inferior ao esperado em março. O PMI da Indústria passou de 50,2 em fevereiro para 49,5 em março, indicando atividade fabril em contração (nível abaixo de 50 pontos) pela primeira vez no ano. Todos os componentes do índice recuaram, com destaque para novos pedidos. A parte do PMI que exclui a indústria também apresentou retração na margem, passando de 51,6 em fevereiro para 48,4 em março, abaixo da expectativa do mercado (50,6). O destaque positivo foi o setor de construção, que avançou para 58,1, ante 57,6 em fevereiro. Contrabalançando esse avanço, o setor de serviços se contraiu para 46,7 pontos em março, ante 50,5 em fevereiro. A tendência de desaceleração da atividade observada nos últimos meses tem sido intensificada pelo aumento de novos casos de Covid-19 em ritmo acelerado e pelas medidas de restrição nas principais cidades do país. Nesse sentido, os próximos dados seguirão refletindo as medidas de restrição impostas.
Na próxima semana
Na agenda doméstica, destaque para a divulgação do IPCA de março (BRAM: 1,29%). No cenário internacional, destaque para a divulgação da ata do comitê de política monetária dos Estados Unidos.