ENFOQUE MACRO | INFORME SEMANAL E PERSPECTIVAS
BRASIL: IPCA tem avanço acima das expectativas em fevereiro
MUNDO: BCE surpreende e sinaliza nova redução dos estímulos
No âmbito internacional, o conflito entre Rússia e Ucrânia está no foco dos mercados. Embora haja significativa incerteza a respeito dos próximos eventos, a semana contou com alguns avanços nas negociações, reduzindo a probabilidade de escalada das tensões. Em razão disso, o petróleo (Brent) cedeu para US$ 110, queda de cerca de 7% na semana. A redução da percepção de risco, somada ao ambiente global de inflação pressionada, também repercutiu sobre as curvas de juros. Nos EUA, a taxa de 10 anos subiu quase 30 pb, enquanto na Alemanha o movimento foi de aproximadamente 40 pb, sofrendo implicações diretas do comunicado mais duro do BCE acerca da condução da política monetária. No mercado local, destaque positivo para o Real, que encerrou a semana cotado em torno de R$ 5,00 (valorização de 1%), descolando-se da performance do Ibovespa, que recuou ligeiramente. Nos juros, a combinação de reajuste de preços de combustíveis, inflação global pressionada e IPCA acima do esperado implicou movimento de alta na curva, com destaque para a alta de cerca de 40 pb na taxa pré-fixada de 10 anos.
A inflação medida pelo IPCA registrou variação de 1,01% em fevereiro, com nova aceleração no acumulado de 12 meses de 10,38% para em 10,54%. O resultado ficou acima da nossa projeção (0,93%) e do consenso de mercado (0,95%), após alta de 0,54% registrada em janeiro. Em relação à nossa projeção, a principal surpresa ficou por conta de alimentação no domicílio (1,65%), que foi bastante impactado por preços de alimentos in natura e industrializados. As principais contribuições para o resultado continuam sendo itens ligados a serviços, principalmente Educação (5,61%), por conta dos reajustes de cursos de ensino fundamental (8,06%) e médio (7,53%), conforme já observado no IPCA-15.
Indicadores qualitativos da inflação não mostraram arrefecimento. Com relação aos núcleos de inflação, que são métricas que excluem ou suavizam a variação de preços de itens voláteis, a média dos núcleos dessazonalizada acelerou de 0,87% em janeiro para 1,01% em fevereiro. Em 12 meses, o indicador atingiu 8,4%. Já o indicador de difusão, que revela quantos itens apresentaram aumento de preços no mês, subiu de 72,7% para 75,1% (exclui alimentação) entre janeiro e fevereiro.
O cenário de inflação é desafiador e ainda não apresenta sinais de inflexão. Em linhas gerais, o IPCA demonstra persistência mais elevada do que o esperado na parte de bens. Serviços, por sua vez, vem demonstrando movimento já esperado de aceleração, por conta da inércia do ano passado. Para esse ano projetamos inflação de 6,2%.
A produção industrial recuou 2,4% na margem em janeiro. O resultado veio abaixo da nossa expectativa (-1,7%) e da mediana das projeções (-1,9%). O recuo pode ser atribuído em maior parte à indústria extrativa, que teve queda expressiva de 5,2%, por conta da interrupção de produção de minério de ferro em Minas Gerais em virtude das fortes chuvas – seu nível de produção passou se situar 5,8% abaixo patamar pré-crise. Já a indústria de transformação apresentou contração de 2,2%, passando a se situar 3,1% abaixo do nível pré-crise. Dentre as atividades, as maiores contribuições negativas vieram da fabricação de veículos (-17,4%) e da metalurgia (-2,8%). De modo geral, os problemas de oferta no mês foram suplantados por uma menor demanda atribuída ao processo de rebalanceamento entre o consumo de bens e serviços. Considerando o núcleo que exclui adicionalmente setores afetados pelo processo de rebalanceamento, haveria alta de 0,4% da produção da indústria de transformação, sugerindo que o deslocamento de demanda tem exercido papel significativo, cenário que deve prosseguir nos próximos meses.
As vendas no varejo restrito em janeiro avançaram 0,8% na margem. Dentre os setores que compõem o varejo restrito, apenas três apresentaram alta. A maior contribuição positiva foi proveniente de outros artigos de uso pessoal (9,4%), seguido por artigos farmacêuticos (3,8%). No lado negativo, destaque para as quedas nas vendas de vestuário e calçados (3,9%), móveis e eletrodomésticos (-0,6%) e vendas de supermercados (-0,1%). O comércio ampliado, que inclui vendas de automóveis e materiais de construção, mostrou direção oposta ao registrar queda de 0,3% no mês. Houve queda das vendas de veículos (-1,9%) e queda de materiais de construção (-0,3%), embora suas vendas se situem 9% acima do nível pré-crise. Em linhas gerais, o resultado do comércio parece confirmar o processo de substituição entre o consumo de bens e serviços. Nesse sentido, os dados dos próximos meses não deverão ser favoráveis ao varejo.
Dados de emprego formal (Caged) apresentam criação líquida de 155,2 mil vagas em janeiro. O resultado foi superior à nossa expectativa (150 mil), mas abaixo da mediana de mercado (160 mil). Com ajuste sazonal, o saldo foi positivo em 171 mil postos de trabalho, ante média de 241 mil vagas nos três meses anteriores. Por trás da desaceleração do saldo na margem está a elevação das admissões (3,5% na margem), em ritmo inferior ao das demissões (6,7%). Vale mencionar que atualmente o patamar de admissões já supera em 26% o nível pré-crise. Na abertura por setor de atividade, todos os setores tiveram resultado positivo, com destaque para serviços (88 mil ante 119 em dezembro), comércio (20 mil ante 2 em dezembro) e agropecuária (18 mil ante 28 em dezembro). Os dados do Caged sugerem continuidade da recuperação do mercado de trabalho formal em meio à reabertura da economia, embora sugira arrefecimento na margem.
Nos EUA, a inflação ao consumidor (CPI) apresentou variação em linha com a expectativa em fevereiro. O CPI variou 0,8% na comparação mensal, enquanto o núcleo, métrica que exclui alimentos e combustíveis, avançou 0,5%. Em termos anuais, o núcleo do CPI teve variação de 6,4%, com alta de 4,4% em serviços e de 12,4% em bens, distantes da meta de 2%. Destaque no mês para o avanço de 0,53% da inflação de aluguéis, que corresponde a um terço do CPI, permanecendo em nível elevado e relativamente estável em 5,4% na média móvel de 3 meses anualizada. A inflação de bens, por sua vez, teve variação de 0,4% em fevereiro, arrefecendo ante as leituras mais pressionadas de janeiro (1,2%) e fevereiro (1%). O quadro inflacionário segue pressionado, o que o corrobora nosso cenário de aumentos seguidos da taxa de juros a partir da próxima semana (25 pb) pelo Fed, até que seja atingido o nível neutro ou moderadamente superior. Não descartamos passos superiores a 25 pb, sendo provável que esse debate esteja presente entre os integrantes do Fed na reunião da próxima semana.
Na Zona do Euro, o BCE prosseguiu no processo de retirada dos estímulos, apesar da incerteza dos impactos do conflito entre Rússia e Ucrânia. O Banco Central Europeu (BCE) manteve a taxa de depósito em -0,5%, a taxa de empréstimo em 0,25% e a taxa de refinanciamento em 0%. A novidade ficou por conta da redução mais rápida do programa de compras (APP), que agora deverá totalizar € 90 bilhões no segundo trimestre, ante € 120 bilhões projetado na reunião anterior. Além disso, a partir de julho, a continuidade das compras dependerá da reavaliação do cenário. A respeito da taxa de juros, o BCE excluiu em seu comunicado a possibilidade de redução dos juros em relação ao patamar atual e indicou que o primeiro ajuste na taxa de juros deverá ocorrer ‘algum tempo’ depois após o fim do APP. A sinalização mais contundente acerca da retirada dos estímulos corrobora uma leitura mais preocupada da inflação, que sofreu revisão altista em todo o horizonte relevante para a política monetária. Ainda bastante incerto em decorrência da evolução do conflito entre Rússia e Ucrânia, com as informações de momento o cenário base contempla alta de juros na reunião de dezembro.
Na próxima semana
Na agenda doméstica, destaque para a reunião do Copom na quarta-feira, para a qual esperamos aumento de 100 pb da taxa Selic. No cenário internacional, destaque para a reunião do Fed também na quarta-feira que deverá contar com o início do ciclo de alta de juros (25 pb).